segunda-feira, 15 de agosto de 2022

Raiz

 Olá, hoje iremos discorrer um pouco sobre um órgão vegetal importantíssimo: a raiz.

Raiz

Costus sp. (Zingiberaceae)

Para que serve a raiz?

 Primariamente: fixação no substrato; absorção e transporte de água e sais minerais.

 Secundariamente: suporte mecânico; estoque de fotoassimilados e outros tipos de reserva.

Num passado distante...

 As primeiras plantas vasculares (traqueófitas) não tinham raízes. O esporófito dos ancestrais das traqueófitas consistia basicamente num caule dicotomicamente ramificado, sem folhas nem raízes. Era independente do gametófito para a nutrição e, nos ápices dos ramos, tinham esporângios terminais. 

 Aglaophyton major, classificado anteriormente como Rhynia major, é um ancestral fóssil das plantas vasculares, que viveu durante o Devoniano inferior (416-398 milhões de anos atrás).

Fóssil de Aglaophyton major


A: Reconstituição de espécimes de Aglaophyton major; B:  Fóssil de Rhynia gwynne-vaughanii 


Reconstituição de Aglaophyton major


 Em 2009, descreveu-se Zosterophyllum shengfengense mostrando um sistema de enraizamento relativamente completo da Formação Xitun do Devoniano Inferior da cidade de Qujing, província de Yunnan, sul da China. O que forneceu uma ideia sobre os primeiros sistemas de enraizamento e raiz.

Zosterophyllum shengfengense - A: fóssil; B: reconstituição.

Sistemas radiculares:


Variações dos sistemas radiculares (especializações da raiz):

Raízes suporte/raízes escora: comum em plantas que vivem em solos pantanosos ou de mangue. Exemplos: Pandanus sp., mangue-vermelho (Rhizophora mangle).

Rhizophora mangle

Pandanus sp.

Raízes grampiformes: em caules rastejantes; possuem força preênsil, podendo escalar suportes. Exemplo: hera (Hedera helix).

Hedera helix

Raízes haustoriais/raízes sugadoras/haustórios: raízes sugadoras de holoparasitas (cipó-chumbo -  Cuscuta racemosa) ou hemiparasitas (erva-de-passarinho, diversas espécies da família Loranthaceae), que penetram no eixo do hospedeiro para retirar sua nutrição. Os haustórios saem de apressórios, órgãos de fixação dessas plantas, formados pelo caule; no caso das holoparasitas, penetram até o floema e no caso das hemiparasitas, até o xilema.

Cipó-chumbo

Erva-de-passarinho

Microscopia de um haustório emitido por um apressório

Raízes tabulares/sapopema: um tipo de raiz suporte; aparecem em algumas árvores de florestas tropicais úmidas. Exemplo: sumaúma (Ceiba pentandra).

Ceiba pentandra

Raízes contráteis: capazes de contrair-se e, ao fazerem esta contração, aprofundam-se no solo, puxando para baixo as partes da planta onde estão inseridas; possui a superfície enrugada transversalmente. Exemplo: jinsém/ginseng (Panax ginseng).

Panax ginseng

Raízes respiratórias/raízes de aeração/pneumatóforos: lenhosas, com geotropismo negativo. Ocorrem em manguezais (Avicennia sp., Laguncularia sp.) e em pântanos (Taxodium sp.). Possuem pneumatódios, estruturas semelhantes a lenticelas, para auxiliar na absorção de O2.

Avicennia marina (note os pneumatóforos emergindo do solo)



Raízes estranguladoras: raízes parasitas que, ao crescerem, envolvem a superfície do tronco do vegetal hospedeiro. Com esse crescimento, é formado uma rede que vai espalhando, impedindo o crescimento da planta hospedeira, que em sua maioria acaba morrendo. Figueiras mata-pau compreendem várias espécies do gênero Ficus (família Moraceae) que apresentam raízes estranguladoras.

Figueira mata-pau (Ficus sp.) envolvendo acuri (Attalea phalerata)

Raízes tuberosas: especializadas no armazenamento. Exemplo: cenoura (Daucus carota), mandioca (Manihot esculenta), beterraba (Beta vulgaris).

Beta vulgaris

Manihot esculenta

Daucus carota


 Lembre-se: raiz tuberosa, tubérculo e bulbo não são a mesma coisa. Tubérculo e bulbo são caules, observe que na batata-inglesa (tubérculo) e na cebola (bulbo) existem gemas, estruturas ausentes na raiz.


Morfologia externa da raiz:


Coifa: protege o ápice meristemático radicular (lembrete: meristema é um tecido com capacidade constante de gerar outros tecidos); no ápice radicular, está o promeristema, capaz de gerar todos os tecidos da raiz. 

 Observação: a percepção da gravidade pela planta está relacionada com a sedimentação dos estatólitos (amiloplastos diminutos), localizados na base das células da coifa.

Phaseolus vulgaris - Estatólitos em células da columela (coifa)


Zona de distensão/zona de alongamento: logo acima do ápice meristemático; suas células alongam-se rapidamente. 

Zona pilífera: com projeções epidérmicas (pelos absorventes ou radiculares).

Os pelos radiculares e a absorção da água. (A) Pelos radiculares do rabanete (Raphanus sativus); (B) Os pelos radiculares aumentam a absorção da água pela capacidade de penetrar nos espaços capilares cheios de água entre as partículas de solo; (C) Os pelos radiculares aumentam várias vezes o volume do solo a partir no qual uma raiz pode extrair água.

Zona de ramificação: é onde estão situadas as raízes laterais.

Nódulos:

 Surgem em muitas espécies de leguminosas, por infestação de bactérias fixadoras de nitrogênio. É uma relação simbiótica, pois a bactéria recebe abrigo e fornece nitrato para a planta.


Célula parenquimática do nódulo da raiz de Vigna unguiculata, “infectada” por bactérias fixadoras de nitrogênio (Rhizobium sp.


Micorrizas: 

 Associação de raízes com determinado fungo. Podem ser ectotróficas/ectomicorrizas (quando as hifas do fungo não penetram nas células) ou endotróficas/endomicorrizas (quando as hifas atingem o córtex). Essa associação potencializa a absorção de nutrientes minerais. Todas as orquídeas e algumas saprófitas possuem esse tipo de raiz.
 


Endomicorrizas penetrando o córtex da raiz.
Células da raiz contendo arbúsculos.

Secção transversal da região periférica de uma raiz endomicorrízica.

 Raízes de Pinus sp. encapsuladas em envoltório de ectomicorrizas.

Morfologia interna da raiz:

Nas espermatófitas há dois tipos de raiz: as com meristema aberto e as com meristema fechado. O segundo é caracterizado pela presença do caliptrogênio (meristema responsável pela formação da coifa), que torna mais evidente a separação entre as células iniciais que fazem parte do promeristema e as células que contribuem para a formação da coifa. No meristema aberto, não há essa separação.


REVISÃO SOBRE MERISTEMAS:

 Os meristemas são tecidos de natureza “embrionária”, cuja principal função é originar novas células. Como os meristemas possuem células indiferenciadas, eles originam todos os tecidos da planta. São eles que são responsáveis, portanto, pelo crescimento em tamanho e também em espessura do vegetal. Além disso, atuam na cicatrização de possíveis ferimentos na planta. 

 Podem ser classificados:

- Quanto à posição: apicais (ápice da raiz e caule; crescimento primário/em comprimento), laterais (interior do caule e raiz; crescimento secundário/em espessura) ou intercalares (Esses meristemas são encontrados entre tecidos maduros, como na base dos entrenós do caule de gramíneas. Assim como os meristemas apicais, estão relacionados com o crescimento da planta em comprimento).

- Quanto à origem: primários (se originam diretamente das células embrionárias e estão relacionados com o crescimento primário/em comprimento do vegetal) e secundários (formados a partir de células diferenciadas que se tornaram novamente meristemáticas. Eles produzem, portanto, tecidos secundários. Responsáveis pelo crescimento secundário/em espessura).

 EM RESUMO, os meristemas primários crescem a planta em comprimento e formam a estrutura primária/tecidos primários, a partir de alguns deles surgem os meristemas secundários que crescem a planta em espessura e darão origem a uma estrutura secundária/tecidos secundários.


Estrutura primária da raiz:

 A estrutura primária da raiz tem origem no meristema apical (promeristema, protoderme, meristema fundamental, procâmbio). Os outros meristemas primários, localizados pouco acima do promeristema, são os responsáveis pela diferenciação dos tecidos primários da raiz:

Protoderme -> sistema dérmico (epiderme).
Meristema fundamental -> sistema fundamental (parênquimas corticais e medulares, colênquima e esclerênquima).
Procâmbio -> sistema vascular (xilema primário, floema primário e câmbio fascicular).

A: esquema do ápice da raiz; B: meristema apical de raiz de Triticum sp.; C: esquema de um corte transversal da raiz em estrutura primária.

 Observação: o câmbio fascicular produz um xilema secundário composto por fibras e elementos de vasos, e o interfascicular, um xilema secundário composto somente por fibras.

 A epiderme da raiz geralmente é unisseriada. No entanto, as raízes aéreas de certas orquidáceas e aráceas epífitas desenvolvem uma epiderme multisseriada. Quando completamente diferenciada, essa epiderme plurisseriada é constituída de células mortas de paredes espessadas e suberinizadas, recebem o nome de velame. Durante os períodos de seca, as células do velame ficam cheias de ar e nas épocas de chuva, cheias de água. O velame tem sido interpretado como um tecido de absorção, e por isso, receberam também o nome de raízes absorventes. No entanto, testes com o uso de corantes vitais, têm demostrado que o velame funciona apenas como uma barreira mecânica, reduzindo a perda de água através do córtex e não, exatamente na absorção da água.


 O córtex da raiz é a região entre a epiderme e o cilindro vascular (tecidos vasculares + periciclo), formado pelo parênquima cortical. A camada interna do córtex, diferencia-se em uma endoderme e, frequentemente, as raízes desenvolvem uma ou mais camadas de células diferenciadas, na periferia do córtex, que se forma logo abaixo da epiderme denominada de exoderme.

 A endoderme é formada por uma camada de células dispostas ao redor do cilindro central ou vascular, onde estão os vasos condutores de seiva. Na parede celular das células da endoderme há acúmulo de lignina, de suberina, ou de ambas, formando uma faixa denominada faixa ou estria de Caspary. A disposição dessa faixa faz com que a água e os sais minerais absorvidos sejam conduzidos por um único caminho viável, que é passando pela membrana plasmática e citoplasma das células da endoderme para chegar até o xilema no cilindro central.





A. Corte transversal da raiz primária de Mandevilla velutina. Ep = epiderme; Pr = pelos radiculares; Ex = exoderme; Pc = parênquima cortical; En = endoderme; P = periciclo; Xp = xilema primária; Fp = floema primário; B. Esquema de uma célula endoderme.

 O cilindro central é delimitado por outro tecido denominado periciclo, que também tem origem no procâmbio. O periciclo é um tecido típico das raízes, formando células não-especializadas, a partir do qual se desenvolvem as raízes laterais ou secundárias. Nas raízes com crescimento secundário, o periciclo pode dar origem ao câmbio vascular e ao felogênio; nas raízes sem crescimento secundário, ele pode originar o esclerênquima.


Raiz lateral de Zea mays. A seta indica conexão vascular com a raiz de origem. M = medula. 

Detalhe do cilindro vascular da raiz de Ranunculus sp.


Corte transversal da raiz de Smilax sp.

 A disposição dos tecidos vasculares no cilindro central varia muito, dependendo da espécie de planta. Os padrões gerais nas monocotiledôneas e nas dicotiledôneas estão representados a seguir.





Estrutura secundária da raiz:

 O crescimento secundário da raiz consiste na formação de tecidos vasculares a partir do câmbio interfascicular e do felogênio. As raízes da maioria das monocotiledôneas, geralmente, não apresentam crescimento secundário.

 O felogênio dará origem à feloderme e ao súber (ou felema); o câmbio interfascicular dará origem ao xilema e floema secundários. 

Câmbio -> floema secundário (para dentro); xilema secundário (para fora).
Felogênio-> feloderme (para dentro); súber/felema (para fora).






Observações:
Periderme = súber + felogênio + feloderme
Lenticela = abertura da periderme que permite a circulação do ar.
Ritidoma = periderme morta que se destaca do caule; cortiça.
Casca = periderme + floema.
Cerne = xilema interno não funcional (impregnado por óleos, resinas e taninos); escuro.
Alburno = xilema externo funcional; claro.
Floema = líber.
Xilema = lenho (cerne + alburno).
Súber = felema
Cortiça pode ser sinônimo de súber ou de periderme.

 Descrição mais detalhada e refinada do crescimento secundário:

 O câmbio vascular (ou apenas câmbio) inicia-se a partir de divisões de células do procâmbio que permanecem indiferenciadas entre o floema e o xilema primários. Assim, no início, o câmbio é formado de faixas, cujo número depende do tipo de raiz; duas faixas nas raízes diarcas; três nas triarca; etc.. Em seguida, as células do periciclo localizadas em frente aos polos de protoxilema, começam a se dividir e, finalmente, o câmbio circunda todo o xilema. Neste estágio o câmbio apresenta o formato oval nas raízes diarcas; estrela de três pontas nas raízes triarca, e estrela de quatro pontas nas raízes tetrarcas.

 As regiões do câmbio localizadas em frente ao floema (derivadas do procâmbio), entram em atividade antes daquelas regiões do câmbio derivadas do periciclo. Com a formação do xilema secundário, o câmbio destas regiões, vai sendo deslocando para fora, até adquirir um contorno circular, quando visto em cortes transversais. A adição de tecidos vasculares secundários, vai provocar um aumento no diâmetro do cilindro vascular e, esse desenvolvimento leva a região cortical da raiz a apresentar modificações, para acompanhar esse crescimento.

 Na raiz a periderme tem origem profunda, também a partir das células do periciclo, que não foram envolvidas na formação do câmbio vascular começam a se dividir, para dar início à formação da periderme. O felogênio (meristema secundário), tem origem das células externas do periciclo e por divisões periclinais de suas células, produz súber (felema ou cortiça) em direção à periferia e feloderme (ou parênquima), em direção ao centro. A formação da primeira periderme provoca a separação da região cortical (inclusive a endoderme) e da epiderme do restante da raiz.

 Nas raízes de reserva, ao contrário do descrito acima, a periderme, geralmente se forma superficialmente, como nos caules, não havendo, portanto, a perda da região cortical (que apresenta substâncias de reserva) com o crescimento secundário.




 Embora a maioria das raízes apresentem crescimento secundário da maneira descrita aqui, inúmeras variações deste crescimento podem ser encontradas em várias espécies. 

 Em Beta vulgaris (beterraba), por exemplo, formam-se faixas cambiais adicionais, dispostas concentricamente, com a produção de grandes quantidades de parênquima de reserva entre o elementos de condução do xilema e do floema.


 O desenvolvimento de algumas raízes de reserva, tais como as da cenoura (Daucus carota), é bastante similar ao das raízes comuns (que não armazenam), exceto por uma predominância de células parenquimáticas no xilema e floema secundários destas raízes de reserva. A raiz da batata-doce (Ipomoea batatas) desenvolve-se de modo muito semelhante ao descrito para a cenoura; entretanto, na batata-doce, câmbios vasculares adicionais formam-se dentro do xilema secundário, ao redor de vasos isolados ou de grupos de vasos. Esses câmbios adicionais, na medida em que produzem poucos elementos traqueais para dentro e poucos elementos de tubo crivados em direção oposta aos vasos, formam principalmente células de parênquima de reserva em ambas as direções. 


 No nível básico de ensino, geralmente diferencia-se a morfoanatomia da raiz e do caule de monocotiledôneas e dicotiledôneas da seguinte forma:

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